O Nordeste vem, ao longo de décadas, apresentando tendência crescente de desenvolvimento de sua produção
Analisando as estatísticas dos principais indicadores da produção de leite, da produtividade dos rebanhos segundo dados disponíveis nas estatísticas IBGE-PPM, observa-se que as regiões maiores produtoras, sul, sudeste e centro-oeste, entre 2019 e 2022, estão estagnadas, seja na produção ou produtividade e tem diminuição de seus rebanhos, variações que oscilam entre -1% a 1%, máximo.
Indicadores Brasil 2019 2022
Prod. Leite (mil LT) 34.871.669 34.609.218
Vacas Ordenhadas (mil) 16.291.727 15.740.153
Produtividade Vacas/ano (mil) 2.140 2.199
Valor da Produção (milR$) 42.141.581 80.043.813
Quanto ao valor da produção, segundo a metodologia do IBGE, os preços pagos aos produtores devem ser obtidos junto aos produtores, cooperativas, associações, sindicatos rurais, mercados municipais, feiras, entrepostos comerciais e agroindústrias. Assim, tomando a produção e valor da produção em cada um dos anos temos que em 2019 o produtor recebia R$1.20 o litro e 2,31 em 2022, quando a produção diminuía o preço aumentava. (Para mais detalhes, acesse os gráficos do site Terra Viva.)
As estatísticas mais recentes ainda não relevam um painel exato do número de produtores na atividade e mais ainda em relação às causas dessa saída, não se pode generalizar as razões, mas dados dos laticínios demonstram que a cada dia há menos produtores dispostos a continuar a produção.
Também se observa que se segue o ritmo da aptidão das terras, do clima regional e das condições culturais e financeiras do produtor, fatores que definem sua migração para os sistemas de produção, quais: carne, grãos, ou mesmo arrendamento das terras e outros.
Mas certamente, pandemia e guerras alteram e explicam as origens dos impactos negativos sobre as matrizes de custos correntes da produção leiteira e, sobretudo, na renda dos consumidores devido a desemprego e renda menor que alteraram a relação de consumo das famílias, visando compatibilizar a uma renda familiar menor.
Mesmo com certo nível de retomada da economia, da renda e emprego, ainda assim o consumo das populações ainda ressente das crises globais que deixaram marcas mais profundas do que se acredita e junto com as crises e facilidades criadas pela evolução da comunicação, se de um lado ajudam as pessoas encontrarem outras formas de trabalho, entre elas a uberização, mas a custa de precariedade e incertezas.
Países com melhores performance produtiva e ainda com subsídios encontraram uma grande oportunidade para colocar seus produtos no Brasil, com vista a atender demanda por menores preços. País que se desponta como grande oportunidade porque sua população está ávida para consumir produtos que se encaixam em seus níveis de renda. Os produtores precisam rapidamente elevar sua produtividade para competirem.
O Estado tem de atuar disponibilizando todas as ferramentas protecionistas possíveis por um lado e por outro, disponibilizar estímulos urgentes aos sistemas produtivos para que possam fazer crescer a sua competividade e aí significa promover políticas públicas inclusivas através de medidas que visem melhorar as infraestruturas de estradas, energéticas de qualidade, assistência técnica estruturada e focada na produtividade, pesquisas em desenvolvimento de produtos, maior volume de crédito para financiamento com prazos mais próximos aos existentes nas economias onde a cadeia láctea é mais desenvolvida. Portanto, é tempo de discutir medidas estruturantes para a cadeia láctea como um todo.
Grande parte das importações são provenientes do Mercosul cuja alíquota de importação é zero. Sendo que até a poucos anos o Brasil importava cerca de até no máximo 5% de sua produção e a partir de 2022 passa importar quase 15%, se considerar leite em pó e queijo mozarela. Claro, os subsídios diretos que possam ser comprovados a sua existência precisam ser submetidos a investigação. Mas, certamente medidas esdrúxulas visando a inibição de importações pelos laticínios sem que se tome medidas idênticas em relação ao Varejo que importa diretamente ou através das diversas trades Argentinas e Uruguaias, certamente é uma punição que não resolvem as problemáticas estruturais. Em parte, se resolve com medidas antiduping, mas não poderia ser somente sobre o leite em pó, visto que a quantidade de queijos mozarela importada é relevante e impacta negativamente por toda a cadeia láctea nacional.
É importante que as autoridades tenham a consciência que não é só os produtores de leite que ressentem pelas enormes importações, mas as pequenas, médias e grandes empresas também porque de repente são alijadas de seu próprio mercado interno, devido aos baixos preços do leite em pó e queijos importados do Mercosul.
Resta ao setor fazer grandes ações, primeiro ter um projeto de curto, médio e longo prazo estruturante para a pecuária leiteira, onde se defina o que a iniciativa privada precisa fazer e quais as ações governamentais de apoio à cadeia láctea são necessárias.
O Nordeste, a evolução dos indicadores produção, tamanho do rebanho, produtividade, valor da produção ainda que assentadas sobre bases relativamente menores que os das 3 maiores regiões produtoras brasileira, vem ao longo de décadas apresentando tendência crescente de desenvolvimento de sua produção, uma região que desde 1974 até 2022, tem uma tendência de aumento de produção, ainda que com soluços, que normalmente são reflexos da severidade das crises hídricas que pairam sobre a maior parte das bacias leiteiras que se encontram sobretudo nas regiões sertanejas áridas e semiáridas.
Mas, como se observa nos gráficos – Navegue no Terra Viva – por volta de 2013, quando inicia um ciclo de diminuição da produção acentuado, porém, enquanto todos as demais regiões entra em estagnação de sua produção o Nordeste reage, diminui o número de rebanho leiteiro, eleva a produtividade do rebanho e sua produção mesmo com um soluço, a partir de 2019 cresce e com melhores condições produtivas.
Os preços dos insumos, sobretudo dos grãos são mais custosos porque a região é importadora, são crescentes e constituem uma das maiores ameaças à pequena produtividade que se inicia e forma um ciclo promissor. Mas onde tem água, visto o calor intenso, as gramíneas, quaisquer que sejam, produzem com fartura, modificam muito a paisagem nas beiradas dos canais e até mesmo represas que atravessam o Nordeste levando a preciosidade da água do Rio São Francisco.
A maior região produtora do Nordeste é o Sertão. Tem mão de obra familiar abundante, ainda. A terra ainda é comparativamente, às demais regiões do país, mais baratas. Existe, comparativamente a outras opções na agropecuária para o produtor, sobretudo porque o leite traz ganhos, até quinzenais, a carne seria anual. O clima é uma barreira para outras opções seja na agricultura que mesmo para pecuária, até porque os investimentos requeridos são menores seja em capital de giro que de investimentos, por exemplo, comparativamente à avicultura, suinocultura.
A evolução tecnológica no plantio de palma adensada faz parte dos lados positivos que permite a pecuária evoluir, fornece um alimento rico, sobretudo em sais minerais. A formação de pastagens capim buffel e mesmo capim capiaçu é crescente.
Os grandes produtores cada vez mais utilizam os compost barns e o que tem sido um sucesso. Em certas regiões da Paraíba o algodão está sendo produzido, talvez melhor que no passado quando o algodão era uma opção. Hoje sua produção beneficia a pecuária, como ração.
Produzir entre 50 e 100 litros por dia, é muitas das vezes melhor que ir morar na cidade, na maioria das vezes desconhecida e mais difícil em todos os sentidos sociais e econômicos, para uma sobrevivência digna que o sertanejo tem de sobra, ainda que muitas vezes humilde.
Esse produtor com assistência técnica apropriada, com estímulos seja privado ou público, apresenta grande resposta em termos de volume e de qualidade da produção. Portanto, alimentação para o rebanho, assistência técnica; genética seja via inseminação artificial e na pior das hipóteses, mesmo com tourinhos mais especializados; financiamento condizentes as necessidades de uma agricultura familiar, são fatores que precisam ser potenciados e podem garantir uma crescente produção, com qualidade.
Ora, o Nordeste é importador líquido para seu abastecimento de lácteos, uma população de cerca de 54% da população brasileira para consumir lácteos e ainda com grande fluxo turístico durante muitos meses do ano.
Não demorou muito e as Empresas de Laticínios locais se deram conta e começaram a crescer em todos os sentidos, temos o Laticínio Belo Vale – produtos Isis, cresce e leva seus produtos para outros estados além da Paraíba, chegando em Fortaleza e Pernambuco.
Os Laticínios Leite Clan e Laticínio Jucurutu, no Rio Grande do Norte, com excelente produção de queijos manteigas, coalhada, iogurte e outros produtos.
Em Pernambuco, o Laticínio Bom Leite, cresce continuamente as suas linhas de produtos. Em Alagoas, o laticínio Palmeiras dos Índios, vale dourado, é uma tradição que oferta variedades regionais.
Em Sergipe, recentemente o Laticínio Damare, original do Espírito Santo – chegou assumindo plantas de leite desativadas, colocando-a para produzir lácteos diversos de qualidade.
No sudoeste da Bahia tem o Laticínio Leitissímo, gerenciada por produtores originais da Nova Zelandia que desenvolveram na região uma produção de leite a pasto, abastece mercados importantes, como Brasília, Salvador, dentre outros, com seus leites e derivados.
No Sul da Bahia se encontra o Laticínio Davaca que produz excelentes queijos, manteiga, dentre outros produtos lácteos em uma diversificada linha de produtos, presentes em praticamente todos os mercados do Nordeste e em outras regiões.
Em Alagoinhas, na Bahia, se encontra o Laticínio Naturalgurt, especializado sobretudo em iogurtes, líder nessa linha de produtos.
Além do crescimento das empresas tradicionais do Nordeste, há empresas regionais que se aliam com empresas tradicionais de outras regiões e buscam alianças estratégicas financeiras internacionais, como é o caso do Laticínio Betânia, do Ceará que forma uma nova empresa juntamente com o Laticínio Embaré, nascendo a Alvoar Lácteos que conta com uma aliança estratégica junto a entidade financeira internacional.
Há também uma crescente presença em Pernambuco da empresa Lactalis, multinacional francesa, a maior produtora de lácteos do mundo.
Assim, diferentemente de um passado até mesmo recente, a produção de leite do Nordeste tem demanda organizada pelo complexo de laticínios que estão cada vez mais se organizando e crescendo suas linhas de produtos lácteos. Dessa forma existe uma série de estímulos que a região tem para oferecer aos seus produtores e sobretudo para oferecer aos seus consumidores.
A tendência é o Nordeste possuir cada vez mais leite, derivados, de qualidade, atendendo as necessidades seja dos produtores ou dos consumidores.
Fonte: Terra Viva